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Hábitos Noturnos: Monique Dardenne

Batemos um papo com uma das mulheres mais influentes nos bastidores da música no Brasil
Escrito por Isabela Talamini
7 min de leituraPublicado em
Monique Dardenne

Monique Dardenne

© Gabriel Talamini

Há dois anos responsável pelas edições do Boiler Room Brasil, Monique Dardenne é um dos grandes nomes por trás de projetos de eventos e curadoria de música no Brasil. Além de produzir festas e agenciar artistas, Monique foi responsável por trazer ao Brasil nomes como Snoop Dogg e Pitbull e hoje comanda sua própria agência, a MD/Agency. Ela ainda tem uma companhia especial: a fofíssima Malu, que, mesmo com poucos meses, a acompanha pelos meetings e correrias pela cidade. Neste Hábitos Noturnos, batemos um papo com a Monique pra saber mais sobre seu histórico, o que a levou largar a carreira de advocacia para trabalhar nesse meio e mais sobre seu papel e das mulheres na música hoje.

Como foi início da sua carreira? Como você chegou a trabalhar nessa área?

Comecei há mais ou menos dez anos, fazendo booking pro Propulse que na época tinha o projeto Influx, um dos primeiros Lives PAs do Brasil. Logo em seguida me convidaram para trabalhar na agência Carambola, que fazia o Festival Tribe. Fiquei lá por quatro anos, fiz bookings de muitos artistas. Minha formação musical foi basicamente em música eletrônica, meu pai era DJ por hobby nos anos 1980 e eu cresci nesse meio. Quando tinha 15 anos já frequentava raves com o meu pai, ele me influenciou muito. Cheguei até a fazer um curso de produção musical e aprender a tocar como DJ em vinil entre meus 16 e 20 anos. Saí da Carambola em torno de 2012 e montei minha agência, a Modular. Durante um ano fizemos uma turnê do Snoop Dogg e duas turnês do Pitbull, entre outras. Por volta de 2013 desfizemos a sociedade e eu acabei criando outra agência sozinha, a MD/Agency, mais focada em management e outras frentes.
Agora você é uma das pessoas à frente do Boiler Room no Brasil, como rolou isso?
Comecei o Boiler Room em outubro de 2013, já foram dez sessões. Conheci o diretor da America Latina no Rio Music Conference (que na época ainda não era), eu tinha acabado de criar a MD/A e estava trazendo o Underground Resistance pro Brasil. Eu lembro que saiu uma matéria de meia página no Caderno 2 do Estadão - escrito pela Cláudia Assef- e eu até cheguei a mostrar isso num encontro por acaso, junto com o meu histórico de trabalho isso também ajudou. Depois de seis ou sete meses ele acabou me convidando para fazer a primeira edição no Brasil, e foi onde tudo começou.

E o line up das edições, quem escolhe os artistas?

Quem faz o line up sou eu, colaboradores aqui do Brasil e a curadoria de Londres. A gente pesquisa muito, eles conhecem bastante de música brasileira também. Eu mando algumas referências e a gente discute o que é interessante ou não. O mais importante agora é o público entender que o Boiler Room não é só música eletrônica, tem espaço para vários estilos. E temos que lembrar também que a primeira audiência é Londres, então a ideia é exportar música daqui pra lá. Pretendemos, cada vez mais, explorar os estilos brasileiros, como foi o show que transmitimos do Hermeto Pascoal.
É uma responsabilidade bem grande estar à frente do Boiler Room. Nós temos que mostrar a realidade da música no país, e a realidade aqui hoje não é a música eletrônica, não é o house ou techno.
Na edição do Boiler Room com a Red Bull, com participação do MC Bin Laden e do MC 2K, tivemos mais de 160 mil views online no mundo inteiro. O pessoal de Londres já queria convidar alguém do funk paulista que está em anscensão e rolou essa oportunidade junto com o Branko, que estava lançando o seu álbum e queria convidar artistas brasileiros que já tinha feito algo junto e que tinha a ver com o seu som. Aqui temos um preconceito muito grande com o funk, principalmente do público de música eletrônica, mas lá fora a aceitação é melhor e muitos DJs, como foi o caso da própria Bjork, estão tocando. Eu respeito todos os estilos de música e respeito o trabalho dos artistas. Todos tem suas histórias e influências, quem sou eu pra falar o que é ruim? É uma responsabilidade bem grande estar à frente do Boiler Room. Nós temos que mostrar a realidade da música no país, e a realidade aqui não é só a música eletrônica, não é o house ou techno. O funk é muito grande, a gente precisa dar atenção para isso também.

E tem muitos ritmos aqui no Brasil mesmo, né? Às vezes a gente esquece disso.

Tem muita coisa ainda para se explorar! Vamos lançar em breve um documentário sobre a cena funk de São Paulo, produzido pelo Konrad Dantas (Kondzilla). Estamos fazendo esse conteúdo pra mostrar pra fora mas vai ser legal para as pessoas daqui também verem as dimensões que o funk tomou e ter um registro. Meu mundo abriu muito depois que eu comecei a trabalhar em selos e essa abertura está me ajudando muito em pesquisas mais profundas. Sempre gostei muito de pesquisar sobre música brasileira. Tem muita coisa pra mostrar, não podemos ficar fechados só num estilo ou formato, porque uma hora vai cansar, vai deixar de ser interessante. Precisamos também registrar o que a gente tem de música aqui. Infelizmente temos pouquíssimas documentações dessas histórias, dessas cenas, e é preciso dar informação de qualidade por isso a idéia de fazer um documentário também.
Monique Dardenne

Monique Dardenne

© Gabriel Talamini

Você teve alguma experiência inesquecível nesses anos de trabalho?

Quando eu fiz a turnê do Snoop Dogg aqui no Brasil teve um show em Fortaleza. A crew dele tem 25 pessoas, deu um trabalhão. Quando a gente chegou lá estava tendo um congresso no hotel que o Snoop se hospedou. Tinham vários políticos, lembro que o José Dirceu estava fazendo check out quando a gente chegou. Tinham duas suítes presidenciais no hotel, uma era de um ministro e a da frente era a do Snoop. Situações engraçadas aconteceram, ele só come Mc Donalds, era carregamentos de batata frita todos os dias.
No dia seguinte ao show era pra todo mundo seguir pro Rio mas, de última hora, o Snoop resolveu ficar pra ver um jogo de futebol americano na TV. Foi uma loucura pra mudar passagens e estadia de uma parte do crew. Mas dos artistas grandes que eu trabalhei ele foi um dos mais simpáticos e humildes pessoalmente. Claro que tem algumas excentricidades, na hora você pensa “nossa, não acredito que ele pediu isso!” mas aí lembra “cara, é Snoop Dogg”. Pra você ter uma noção, os seguranças dele eram tão grandes que precisamos comprar duas poltronas do avião para cada [risos].
Como você sente a presença das mulheres no mercado da música? Rola um preconceito?
Eu acho que, como mulher, infelizmente ainda é preciso conquistar respeito e credibilidade com trabalho e seriedade. Obviamente já passei por algumas situações que não foram legais e até hoje passo. Eu trabalho muito com homens, a gente sabe que praticamente 90% do mercado da música é comandado por homens então você sempre acaba ouvindo alguma coisa. Mas eu fui criada por homens, é a coisa de saber lidar, nunca abaixar a cabeça, ter uma posição firme.
A realidade é que não são poucas mulheres na música, são muitas, só que elas não aparecem.
Eu criei a comunidade “Mulheres Na Música” no Facebook e inclui meninas de diversas áreas, não só de música eletrônic e não só DJs e produtoras. Já tem cerca de 170 mulheres. A gente troca informações e faz indicações. A realidade é que não são poucas meninas na música, são muitas mas elas não aparecem. O intuito é se unir, comunicar e criar uma rede de relacionamentos, saber o que as outras estão fazendo.

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