Era pra ser um dia que mudaria a vida e a carreira do surfista de ondas grandes inglês Andrew Cotton. O mar estava enorme em Nazaré. Ele e outros atletas encaravam as ondas gigantes em busca da maior delas para a quebra de um recorde mundial. Até que Cotton foi engolido por uma poderosa montanha de água.
"Caí da prancha. Estava esperando o impacto. Seria um golpe forte e iria doer. Mas não houve impacto", conta Andrew. No surfe de ondas grandes, geralmente você cai, leva uma surra da onda, fica numa espécie de efeito de máquina de lavar debaixo d'água e depois aparece. Mas essa vaca foi diferente. "O voo parecia estar durando muito mais tempo. Então, assim que relaxei despencando, bati na parte plana da água. Foi nesse momento que quebrei minha coluna", conta.
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Assista aos melhores momentos da temporada histórica de 2017–18 em Nazaré
Alex Laurel nos traz os melhores momentos da épica temporada de 2017-2018 em Nazaré, com Lucas Chumbo, Andrew Cotton e Hugo Vau.
Cotton e o surfista americano Garrett McNamara foram os pioneiros em Nazaré, Portugal, no início de 2010. Na época do acidente – 8 de novembro de 2017 – Andrew já havia pegado algumas das maiores ondas da vida por lá.
Ele estava surfando quando viu essa onda enorme se aproximar. Mas na medida em que seu parceiro o colocou na fatídica onda, ela se transformou rapidamente em um monstro cavernoso. "Eu imediatamente soube que não ia ser bom. Mas não tinha mais como sair dali", relembra.
Passou da onda mais perfeita para a onda mais cabulosa em uma fração de segundo
Andrew sentiu muita dor no choque e entrou no modo sobrevivência. "Usamos coletes infláveis sob nossos ternos, mas a dor era tão forte que nem consegui inflar o colete", conta. "Quebrei minhas costas na primeira onda, fiquei debaixo d'água por algum tempo, então a próxima onda me pegou novamente. Foi na segunda onda que consegui me recompor, puxei o colete e eles conseguiram me resgatar".
Hugo Vau, seu parceiro de tow-in, conseguiu resgatá-lo. Mas eles ainda foram pegos por outra onda e caíram na água. Por sorte estavam perto da praia e foram levados pra lá. "Tive a sensação de que não conseguia ficar de pé ou andar", explica Andrew. "Enquanto na água tinha entrado em modo de sobrevivência, na praia, fiquei com medo. A ambulância chegou em poucos minutos e me levaram direto para o hospital".
No hospital, Andrew passou por momentos de muita tensão. Sem entender português, ele não conseguia entender a real dimensão de seu acidente. Se ficaria em uma cadeira de rodas, ou se conseguiria se recuperar para voltar ao surfe.
Olhei para Garrett e foi a primeira vez que o vi parecer preocupado
Andrew ficou duas semanas no hospital em Portugal. Depois foi levado para Manchester, na Inglaterra, ou continuou seu tratamento de recuperação. Apesar do baque psicológico enorme, Andrew passou a pensar positivamente. "Comecei a pensar nas minhas costas sendo curada, não quebrada.", diz.
"Eu sabia que não iria conseguir surfar por algum tempo, então tive que aceitar", diz. No dia do acidente, o brasileiro Rodrigo Koxa de fato quebrou o Recorde Mundial, então para Andrew, não adiantava ficar pensando no porque das coisas terem acontecido daquela forma. Agora ele precisava focar na recuperação na Inglaterra, onde tinha um fisioterapeuta e toda uma equipe médica dedicada.
"Foi incrível ser tratado como um atleta de verdade. Surfistas nem sempre são tratados como atletas, são tratados mais como lunáticos. Não estamos em um time de futebol, então nem sempre temos acesso aos melhores fisioterapeutas ou às melhores informações e aos melhores médicos. Então, para mim, mentalmente, ter um fisioterapeuta foi incrível", conta.
A abordagem foi: esqueça o surfe e coisas que você não pode fazer e foque nas coisas que você consegue. Então, Andrew focou na recuperação e passou até gostar dela. Mas passava por momentos que chegava a duvidar. "Você tem períodos de baixa. Noites podem ser longas. Você pode ficar muito deprê com as mídias sociais. Telefones podem ser a pior coisa. Então apaguei tudo e não mexia no telefone", conta.
O trabalho era como reconstruir uma casa, começando nos músculos mais profundos do corpo
Andrew estava surfando novamente na praia onde mora em seis meses. Na primeira queda no mar, sentiu que estava reaprendendo tudo novamente. "Você quer de cara surfar de pranchinha e fazer manobras progressivas. É preciso perceber que não poderá fazer isso por um tempo. Então, você está surfando, mas não está surfando. O ego toma uma surra nessa hora. Então, você precisa se desconectar disso e aproveitar o agora. Apenas pegar umas ondas, mesmo não mandando bem como você deseja ou tão bem quanto sabe que pode."
Andrew estava de volta à Nazaré surfando ondas grandes depois de um ano. Ele não estava com medo, mas chegou a se questionar: 'Esse é o meu caminho, é isso que eu realmente quero fazer?' Mas quando uma grande ondulação chegou, ele já rapidamente ficou confortável de nov e percebeu que faz isso pelas razões certas. "Eu amo tudo isso. Não estou tentando provar nada para ninguém, faço isso por mim".
A reabilitação foi aprender a gostar das coisas que posso fazer e não pensar nas coisas que não posso
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